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5 - Cuidado com o que deseja

Nem podia acreditar que já havia se passado um mês desde que encontrara a pedra com as inscrições, obviamente metade do tempo desde então havia sido para descobrir o que elas significavam ou mesmo se tinham algum sentido. Foi durante uma madrugada que ele enfim soube, os símbolos eram instruções de invocação de um ser superior.

Segundo o artefato, apenas no Samhaim – o conhecido halloween – e durante todo o mês ele foi se preparando para a cerimônia que realizaria, entretanto, o homem não percebeu que a medida que os dias passavam seu corpo sofria com mudanças, um quesito que teve influência foi o fato dele ter-se isolado em casa desde a descoberta. Dentre as alterações: sua face se tornou mais marcada na mandíbula, suas maçãs do rosto mais proeminentes e até um par de caroços em sua cabeça, como se algo fosse sair dali. Já seu comportamento sofrera também, mas para ele nada que fosse digno de preocupação, além de tornar-se recluso, passou a evitar se vestir, comia pequenas porções de comida – hábito que impactou em muito sua aparência visto que, era um homem alto – e por fim, trocou o dia pela noite, acabou por esquecer quando foi a última vez que saíra tomar sol.

Deixou a sala de estar e andou para o seu quarto, era lá que aconteceria o ritual e ele estava ansioso em demasia. Acreditava que poderia reivindicar qualquer coisa ao Ser que ele traria para o plano físico, havia também toda a curiosidade quanto à imagem desta entidade, sua mente havia passado por diversas possibilidades e ainda assim, nada sabia.

O cômodo passou por toda uma transformação nos últimos dias, a cama deu lugar a um pequeno altar de madeira enegrecida, em sua superfície velas vermelhas como sangue estavam distribuídas. Já o armário e a mesa do computador, foram levados para o outro quarto e em seu lugar ele deixou o colchão.

Observou o seu redor, tudo estava como ele desejava, olhou então para o relógio na parede mais próxima da porta, a hora se aproximava e ele precisava se preparar. Alcançou o isqueiro no altar, acendeu cada vela e foi até a janela para fechar as cortinas negras, a última coisa que ele precisava era alguma criança fantasiada em busca de doces observando-o.

Retirou o conjunto moletom que vestia e o deixou jogado no canto, andou até o centro do quarto e se sentou sobre as pernas. Respirou profundamente lembrando as palavras que tão custosamente decorou.

A voz rouca e um tanto fraca começou a entoar o ritual. A cada palavra dita ele sentia que a atmosfera do quarto ia se condensando, na metade do processo um vento sobrenatural circulou pelo cômodo fazendo com que as velas por pouco não se apagassem. Assim então surgiu um ponto de luz acima de sua cabeça que lhe chamou a atenção.

— Está funcionando! – o êxtase inundando sua voz. — Não posso acreditar, está funcionando!

O final do ritual foi feito com sua voz que foi minguando enquanto ele encarava o que acontecei acima de si. A luz transformou-se em uma diminuta esfera vermelho-sangue, que assim que ele finalizou com a última palavra, ela foi-se espalhando como um tecido por toda a extensão do teto, porém sem tocar em nada.

Aos olhos dele era como se já não existisse mais o seu teto, seu telhado e nem nada, havia um outro mundo ali, mais claro com luzes amarelas e alaranjadas e então surgia uma silhueta alta e de aparência robusta. Percebeu que a mão do outro lado foi levantada e vinha em direção a fina barreira que separava os dois mundos, o toque fez com que o tecido se esticasse para frente como um tecido elástico e que ao chegar no seu limite rompeu-se e ele pode perceber que os mundos estavam espelhados.

Mão, braço, ombro e tronco foram surgindo á medida que o Ser descia, quando por fim seu rosto surgiu, o homem ficou paralisado – não de medo como se esperava – mas sim de admiração, como se ele visse o próprio Criador frente a frente. O tecido vermelho foi-se moldado com duas pontas se prendendo ao ombro do Ser e o restante lhe caindo as costas comi uma capa. Ele não tocou o chão com os pés, mas sim ficou alguns centímetros do chão, olhava para o homem com seriedade até que falou:

— Foi você quem me despertou, mortal? – era tão difícil para ele conseguir encontrar palavras para responder que apenas foi possível por meio de um aceno positivo de cabeça. — E que dia é hoje?

Lambeu os lábios e por fim falou:

— Halloween, meu senhor, ou na verdade é Samhaim.

O termo servil fez com que a criatura abrisse um pequeno sorriso satisfeita.

— Não poderia haver momento melhor para o meu despertar!

Criatura e humano se olhavam, o humano decidindo qual seria o momento de pedir sua recompensa, já a criatura tinha um semblante enigmático.

— Acredito que você espera receber algo em troca pelo serviço que me prestou, estou certo?

— Sim. – Segurava as próprias mãos ansioso. – Quero ser imortal e poderoso.

— E assim o será!

A criatura se aproximou do jovem, levou as mãos até o queixo dele e o levantou sem esforço algum. Neste momento o rapaz já estranhava o método do outro, entretanto apenas o fitava em expectativa.

— Serás imortal e poderoso como deseja, fará parte de mim e estará em mim para todo o sempre.

Foi apenas naquelas palavras que ele percebeu seu erro e o horror começava a lhe invadir, tentou se soltar, mas nada feito, não havia como medir forças com um ser daquele. Se debatia, chutava o ar tentando atingir o outro, porém era como uma criança que fazia birra.

— Por favor, me deixe em paz. – Choramingou sendo respondido por uma risada maléfica.

A criatura o forçou a encará-lo, seus olhos escureceram enquanto ele abria a boca.

— Paz é algo que você vai esquecer se um dia conheceu.

O rapaz sentia que sua energia estava sendo sugada pela criatura, mas na verdade era sua alma que deixava seu corpo, em um último momento de lucidez ele visualizou um campo todo queimado com estacas por sua extensão, ali seria seu novo lar, seu lugar de agonia eterna e arrependimento.

Com o corpo vazio em mãos a criatura o soltou ao chão sem cerimônias. Deixou o quarto do rapaz e se viu em um corredor repleto de porta retratos pela parede e observou. Utilizando de um de suas dons, fez com que uma roupa se materializasse em seu corpo, andou até o que acertadamente achou ser a saída daquele lugar, abriu a porta e antes de deixar a casa se viu no espelho ao lado da porta.

— É hora de trazer o terror para essas criaturas fracas.

Deixou o lugar se misturando por entre as pessoas que despreocupadas acompanhavam seus filho em busca de doces, mal sabiam elas que o horror encarnado caminhava entre elas.

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